sábado, 11 de fevereiro de 2012

VI DOMINGO DO TEMPO COMUM
12 DE FEVEREIRO DE 2012

Primeira Leitura: 2º Reis 5, 9-14
Leitura do segundo livro dos Reis - Naqueles dias, Naamã veio com seu carro e seus cavalos e parou à porta de Eliseu. Este mandou-lhe dizer por um mensageiro: Vai, lava-te sete vezes no Jordão e tua carne ficará limpa. Naamã se foi, despeitado, dizendo: Eu pensava que ele viria em pessoa, e, diante de mim, invocaria o Senhor, seu Deus, poria a mão no lugar infetado e me curaria da lepra. Porventura os rios de Damasco, o Abana e o Farfar, não são melhores que todas as águas de Israel? Não me poderia eu lavar neles e ficar limpo? E, voltando-se, retirou-se encolerizado. Mas seus servos, aproximando-se dele, disseram-lhe: Meu pai, mesmo que o profeta te tivesse ordenado algo difícil, não o deverias fazer? Quanto mais agora que ele te disse: Lava-te e serás curado. Naamã desceu ao Jordão e banhou-se ali sete vezes, como lhe ordenara o homem de Deus, e sua carne tornou-se tenra como a de uma criança. - Palavra do Senhor.
Salmo Responsorial (31)
REFRÃO: Sois, Senhor, para mim, alegria e refúgio.
1. De Davi. Hino. Feliz aquele cuja iniqüidade foi perdoada, cujo pecado foi absolvido. Feliz o homem a quem o Senhor não argúi de falta, e em cujo coração não há dolo. - R.
2. Então eu vos confessei o meu pecado, e não mais dissimulei a minha culpa. Disse: Sim, vou confessar ao Senhor a minha iniqüidade. E vós perdoastes a pena do meu pecado. - R.
3. De Davi. Hino. Feliz aquele cuja iniqüidade foi perdoada, cujo pecado foi absolvido. - R.
Segunda Leitura: 1º Coríntios 10, 31-33; 11, 1
Leitura da primeira carta de São Paulo aos Coríntios - Naqueles dias, Portanto, quer comais quer bebais ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus. Não vos torneis causa de escândalo, nem para os judeus, nem para os gentios, nem para a Igreja de Deus. Fazei como eu: em todas as circunstâncias procuro agradar a todos. Não busco os meus interesses próprios, mas os interesses dos outros, para que todos sejam salvos. 1Tornai-vos os meus imitadores, como eu o sou de Cristo. - Palavra do Senhor.
Evangelho: Marcos 1, 40-45
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, segundo Marcos - Naquele tempo, Aproximou-se dele um leproso, suplicando-lhe de joelhos: "Se queres, podes limpar-me." Jesus compadeceu-se dele, estendeu a mão, tocou-o e lhe disse: "Eu quero, sê curado." E imediatamente desapareceu dele a lepra e foi purificado. Jesus o despediu imediatamente com esta severa admoestação: "Vê que não o digas a ninguém; mas vai, mostra-te ao sacerdote e apresenta, pela tua purificação, a oferenda prescrita por Moisés para lhe servir de testemunho." Este homem, porém, logo que se foi, começou a propagar e divulgar o acontecido, de modo que Jesus não podia entrar publicamente numa cidade. Conservava-se fora, nos lugares despovoados; e de toda parte vinham ter com ele. - Palavra da salvação.

A autoridade de Jesus e a marginalização
A liturgia de domingo passado mostrou que Jesus não se deixou “privatizar” pela população de Cafarnaum, mas seguiu sua vocação para ir a outras cidades também. Hoje vemo-lo saindo para a margem da sociedade, para os lugares desertos onde viviam aqueles que na época eram chamados leprosos. Estes eram intocáveis, tabu! Jesus quebra esse tabu e, no fim, acaba ocupando o lugar do doente, nos “lugares desertos”.
Como nos evangelhos anteriores, vemos aqui uma indicação velada da personalidade de Jesus. Autoridade e compaixão, duas qualidades dificilmente compatíveis no ser humano, são as feições divinas que se deixam entrever no agir de Jesus. E revela-se sua superioridade em relação à Lei, segundo a qual Jesus não poderia tocar no leproso. Ele não depende da Lei para realizar o bem da pessoa. Por autoridade própria, reintegra o ser humano que a letra da Lei marginaliza.
Este tema convida a uma catequese sobre a reintegração dos que são marginalizados. Para que nós, como membros do Cristo, possamos realmente vencer a marginalização, será preciso agir com uma autoridade que esteja acima das convenções constrangedoras do sistema em que vivemos. Precisamos encarnar, de modo operante, essa compaixão reintegradora, neutralizando os mecanismos de marginalização e exclusão com a força divina da verdadeira solidariedade, baseada no amor.

A 2ª leitura continua o tema de domingo passado, sobre as carnes oferecidas aos ídolos. Paulo se apresenta a si mesmo como exemplo, pois o pregador deve ser a ilustração daquilo que prega. O apóstolo quer agradar a todos, não para lograr sucesso pessoal, mas para o bem de todos, a fim de que se deixem atrair por Cristo. Este texto é uma das mais lindas exortações que a Bíblia contém.
1ª leitura (2Rs. 5,9-14)
Para ilustrar o tema do evangelho de hoje, a liturgia propõe (como leitura opcional) a cura do general sírio Naamã pelo profeta Eliseu. A leitura nos mostra o horror que a doença causa nesse homem de destaque, a ponto de procurar um profeta em terra estrangeira, em Israel. O recorte litúrgico não inclui a descrição dos ricos presentes que o homem trouxe para o profeta e que realçam ainda mais o seu status. Menciona, sim, o orgulho de Naamã, que julga pouca coisa banhar-se no rio Jordão, um riacho, em comparação com os rios da capital de sua terra, Damasco. Mas, aconselhado pelos servos, o homem banha-se, assim mesmo, no rio Jordão e fica curado: “sua carne tornou-se semelhante à de uma criancinha”.
Em Israel, a lepra causava exclusão da comunidade e suspeita de algum pecado. Em contraste, o salmo responsorial (Sl. 32/31,1-2.5.11) canta a alegria de ser perdoado e readmitido.
Evangelho (Mc. 1,40-45)

O canto de aclamação ao evangelho fala de Deus que visita o seu povo (Lc. 7,16). É isso que acontece quando Jesus vai aos lugares ermos, onde encontra um leproso bem diferente do da 1ª leitura, Naamã. Este procurou Eliseu com pompa e vaidade. No evangelho, Jesus mesmo vai até o lugar onde o doente vive excluído, marginalizado. No exercício da “autoridade” divina sobre as forças do mal e, ao mesmo tempo, levado por uma compaixão humana que não deixa de ser divina, Jesus quebra o tabu da lepra, toca o doente e faz desaparecer a enfermidade. Na opinião do povo, a lepra devia ser obra de algum espírito muito ruim. Jesus quebra esse tabu. O doente reconhece em Jesus uma misteriosa “autoridade”, seu poder sobre os espíritos maus. “Se quiseres, tens o poder de me purificar” (Mc. 6,40). Jesus não pensa nas severas restrições da Lei, só sente compaixão, aquela qualidade divina que ele encarna. Apesar da proibição da Lei, toca no doente de lepra, dizendo: “Eu quero, sê purificado”. E a cura sucede. Jesus dá um sinal do reino. Se ele cura pelo “poder-autoridade” do Filho do homem, não é preciso primeiro consultar os guardiões da Lei. Basta que, depois de receber o benefício de Deus, o doente ofereça o sacrifício de agradecimento, conforme o rito costumeiro.
Como aos exorcizados, Jesus proíbe ao ex-leproso publicar o que sua “autoridade” operou. Manda o homem oferecer o sacrifício prescrito, para oficializar sua reintegração na comunidade. Jesus lhe proíbe publicar o ocorrido, porque a publicidade desvia a percepção da verdadeira personalidade de Jesus (que não apenas cura, mas também assume o sofrimento humano). Mas o ex-leproso não é capaz de silenciar o fato. Quem conseguiria esconder tanta felicidade? O homem, até então marginalizado, encontrou a reintegração e aproveitou-a para contar o que lhe acontecera. Mais: Jesus foi ocupar o lugar do leproso nos “lugares desertos” (1,45).
Esse episódio faz pressentir a crescente e mortal oposição das autoridades religiosas: Jesus sabe o que é o bem do homem melhor do que a Lei, segundo a interpretação dos escribas. Por autoridade própria, reintegra a pessoa que a letra da Lei marginalizava. Restaura a comunhão com o excomungado, passando para trás os que tinham o monopólio da reintegração. Aceitar este Jesus significa aceitar alguém que supera as mais altas autoridades religiosas. Nesse sentido, a cura da lepra funciona como um sinal: significa que, de fato, Jesus está acima das prescrições legais e pode prescindir delas.

2ª leitura (1Cor. 10,31-11,1)
Ao fim da discussão sobre a carne consagrada aos ídolos (1Cor 8-10; cf. domingos anteriores), Paulo tira as conclusões práticas. Comprar carne desses banquetes no mercado, sem ninguém o saber, pode parecer sem importância (10,25). Se, porém, alguém o sabe e se escandaliza, então não se deve comer dessa carne, por amor ao fraco na fé (10,28-29), pois não seria possível comê-la agradecendo a Deus (10,30). Daí a atitude geral: fazer tudo de sorte que seja um agradecimento a Deus, o que acontece quando é para o bem dos outros. Por fim, Paulo atreve-se a apresentar-se como exemplo, sendo Cristo o exemplo dele (cf. 1Cor 11,1; Fl. 3,17).

Dicas para reflexão
A exclusão virou princípio da organização socioeconômica: a lei do mercado, da competitividade. Quem não consegue competir deve desaparecer, quem não consegue consumir deve sumir. Escondemos favelas por trás de placas publicitárias. Que os feios, os aleijados, os idosos, os doentes de Aids não poluam os nossos cartões-postais!
Em tempos idos, a exclusão muitas vezes provinha da impotência diante da enfermidade ou, também, da superstição. Em Israel, os chamados leprosos eram excluídos e marginalizados, como ilustra abundantemente a legislação de Lv 13-14. Enquanto não se tivesse constatado a cura, por complicado ritual, o doente de lepra era considerado impuro, intocável. Jesus, porém, toca no homem doente e o cura. Sinal do reino de Deus. Jesus torna o mundo mais conforme ao sonho de Deus, pois Deus não deseja sofrimento nem discriminação. O Antigo Testamento pode não ter encontrado outra solução para esses doentes contagiosos que a marginalização, mas Jesus mostra que um novo tempo começou.
Começou, mas não terminou. Reintegrar os marginalizados não foi uma fase passageira no projeto de Deus, como os presentinhos dos políticos nas vésperas das eleições. O plano messiânico continua por meio do povo messiânico. Devemos continuar inventando soluções para toda e qualquer marginalização, pois somos todos irmãos e irmãs.
Seremos impotentes para erradicar a exclusão, como os antigos israelitas em relação à lepra? Que fazer com os criminosos perigosos, viciados no crime? O fato de ter de marginalizar alguém é reconhecimento da inadequação de nossa sociedade. Toda forma de marginalização é denúncia contra nossa sociedade e ao mesmo tempo um desafio. Muito mais ainda em se tratando de pessoas inocentes. A marginalização é sinal de que não está acontecendo o que Deus deseja. Onde existe marginalização o reino de Deus ainda não chegou, pelo menos não completamente. E onde chega o reino de Deus, a marginalização já não deve existir. Por isso, Jesus reintegra os marginalizados, como é o caso do leproso, dos pecadores, publicanos, prostitutas… Essa reintegração está baseada no “poder-autoridade” que Jesus detém como enviado de Deus: “Se quiseres, tens o poder de me purificar” (Mc 1,40). Jesus passa por cima das prescrições levíticas, toca no leproso e “purifica-o” por sua palavra, em virtude da autoridade que lhe é conferida como “Filho do homem” (= “executivo” de Deus, cf. Mc. 2,10.28).
Há quem pense que os mecanismos autorreguladores do mercado são o fim da história, a realização completa da racionalidade humana. E os que são (e sempre serão) excluídos por esse processo, onde ficam? Não será tal raciocínio o de um varejista que se imagina ser o criador do universo? A liturgia de hoje nos mostra outro caminho, o de Jesus: solidarizar-se com os marginalizados, os excluídos, tocar naqueles que a “lei” proíbe tocar, para reintegrá-los, obrigando a sociedade a se abrir e criar estruturas mais acolhedoras, mais messiânicas.

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